quarta-feira, 29 de julho de 2009

Minhas Memórias de Leitura - Prof. Stéfano Couto Monteiro

DEFINIÇÃO DE MEMORIAL
Dentre os gêneros textuais, há alguns relacionados ao registro das vivências e atividades humanas. Porém, dois deles atentam para a percepção da própria pessoa sobre si ao escrever – a autobiografia e o memorial. Ambos registram de alguma forma a trajetória de quem o escreve.

QUEM SOU
Meu nome é Stéfano Couto Monteiro. Sou filho de João Geraldo Monteiro e Maria da Pena Fernandes Couto. Nasci a 27 de Junho de 1981, na cidade de São Bernardo do Campo, estado de São Paulo.
Devido o quadro de saúde que eu apresentava desde recém nascido (tive bronquite asmática e pneumonia crônica), associado à vontade de meus pais de regresso à terra natal, cheguei na Bahia em 20/03/1984, mas propriamente dito na cidade de Eunápolis, assim localizada geograficamente a
Þ 650 km de Salvador, capital do Estado;
Þ 64 km de Porto Seguro, cidade a que atribuem a chegada dos portugueses no Brasil;
Þ 90 km de Santa Cruz Cabrália, cidade onde atualmente resido e exerço as minhas atividades profissionais.
Minha vida escolar pode ser descrita com a menção dos estabelecimentos onde estudei:
Þ Ensino Fundamental na Escola Municipal Anésia Guimarães (1ª a 4ª séries) e Escola Municipal Gabriel José Pereira (5ª a 8ª séries). Nesta última, iniciei a minha vida de liderança estudantil, exercendo a função de representante de turma da 5ª a 7ª séries e, fundador do Grêmio Estudantil. Quase fui expulso da escola por encabeçar um movimento de reintegração ao cargo de 07 professores que haviam sido exonerados por causa de perseguição política;
Þ Ensino Médio no Colégio Estadual Monte Pascoal (Formação Geral). Nesse período, tive que enfrentar o problema do isolamento e da discriminação social, devido o fato de ser lavador de carro e ter o padrasto como professor de Língua Portuguesa, cujo gosto pelo ensino gramática sempre me fascinou pelo domínio que apresentava ter;
Þ Graduação em Letras – com habilitação em Língua Portuguesa e Literatura pela UNEB (Universidade do Estado da Bahia – Campus XVIII), concluída em Agosto de 2005. Tenho coisas a registrar (pela primeira vez) sobre a minha passagem na Academia. Nela reafirmei a minha condição de Líder estudantil – de secretário ad doc a Coordenador do Diretório Acadêmico de Letras, cujo ponto de auge foi o reconhecimento do Curso de Letras. Fiz com que um professor de Psicologia chorasse publicamente. Enfrentei pela primeira vez a chamada “prova final” por escrever um sermão caracterizando-o como texto argumentativo (o que não foi aceito pelo Professor da Disciplina Oficina de Redação). Fiquei dessemestralizado e tive contato com quase todas as turmas que cursaram no campus entre 2001 e 2006;
Þ Técnico em Hematologia e Hemoterapia – Fundação Hemoba. Cursei na esperança de ser admitido para trabalhar no Hemocentro da cidade. Quase comprometi o 3º semestre da graduação. Não consegui o objetivo, mas adquiri conhecimento e formação sobre o funcionamento de um Banco de Sangue e da captação de recursos;
Þ Pós Graduação Lato Sensu em Literatura Brasileira pela UNIVERSO (Universidade Salgado de Oliveira), concluída em Abril de 2007.
Þ Pós Graduação em Leitura, Interpretação e Produção Textual pela UNIME, concluída em Maio de 2009.
Sou concursado pela Prefeitura Municipal de Santa Cruz Cabrália (admitido em Agosto 2006) e pela Secretaria Estadual de Educação para exercer a função de Professor de Língua Portuguesa (admitido em Abril 2007).

VIVÊNCIAS DE LEITURA – DO DESPERTAR AO ENCANTO
DA EDUCAÇÃO INFANTIL AO 9º ANO
A minha experiência com a vida escolar não inicia-se com na Educação Infantil. Aliás, só tive conhecimento com tal nomenclatura há pouco tempo. Falava-se em “pré”, “jardim I e II”, mas eu não fora introduzido, devido não ser gratuito. Iniciei na 1ª série.
O contato com a leitura foi possível graças a influência e interferência da minha mãe, a qual não dispunha de instrução. Ela descende de família mineira, cujo sistema de criação não lhe permitira o acesso à leitura e a escrita “para não correrem o risco de aprenderem escrever carta para o namorado”. Mesmo assim, sempre me apoiou e incentivou a estudar, sob o pretexto de que “somente através do estudo pode-se ser alguém na vida”. Já o meu pai, via a condição de encaminhar a escola como um encargo, pois viriam os livros, os cadernos e os demais itens da famosa lista de materiais. Quando ingressei na vida escolar em 1989, eu já sabia ler, escrever e dominava 03 das quatro operações matemáticas.
Na época, predominava nas escolas municipais de Eunápolis o uso da coleção da autoria de Joanita Souza, “Brincando com as Palavras”, na qual, tinha um texto do qual recordo-me muito bem – “Quando dois cães se comunicam” – cujo enredo demonstra a valorização da amizade.
Em nenhuma das escolas onde cursei o ensino fundamental existia biblioteca. Nas séries iniciais, duas situações foram marcantes: a primeira, quando na 1ª série a professora Doracy Ferreira Souza convidou a minha mãe para avisar-lhe que iria transferir-me para a turma da 2ª série, devido o desenvolvimento que eu já apresentava, cuja proposta não se concretizou por que, na visão da minha mãe, eu e a minha irmã deveríamos estudar juntos, ao passo que, a segunda, consistia na prática de educação física, a qual acontecia em turno oposto, sob o comando de um soldado professor de nome Laureano, que colocava os alunos para percorrerem as ruas do bairro Pequi ao som de cantigas e gritos de guerra. Uma delas, tinha o seguinte refrão:
“Alguém cansado?
Ninguém cansado
Aqui não tem doente
Nem tão pouco aleijado
Aqui só tem alunos do Anésia Guimarães”
Já nas séries finais, apaixonei pelo estudo da história, disciplina em que me considero um autodidata. Tomei gosto pelo conhecimento dos mitos, cuja leitura era um problema para o meu professor de história, pois assim que ele terminava de ministrar a aula, eu dirigia-me a ele, indagando-lhe sobre o assunto da próxima aula, cujo interesse sinto falta nos alunos da atualidade.

ENSINO MÉDIO
Entramos em contato com diversas propostas para a educação, mas sempre temos a tendência de valorizar o saber enciclopédico. Tive vários professores e situações marcantes. Porém, em respeito à proposição, cito os professores que tive de Língua Portuguesa ao longo do ensino médio.
Um deles foi o meu padrasto (in memorian – falecido em 2004). Ele amava gramática e, para sanar as dúvidas dos alunos, mostrava as ocorrências em latim e agia assim, sempre demonstrando a condição de o português ser oriundo da língua latina. Além disso, ele era irreverente e tinha predisposição a fazer coisas inusitadas como soltar uma flatulência em sala de aula ou ainda preparar 10 avaliações para evitar a “cola” por parte dos alunos. Em casa, para dizer que nunca contribuiu, ele solicitava para minha cobrar aplicação e quando estávamos a conversar, quando eu citava algo fora da língua padrão, ele sempre perguntava “O que você falou aí mesmo?”.
O outro, era professora. Tinha formação inicial em Direito e, quando ela falava sobre literatura, parecia estar diante de um julgamento, pois falava empolgada, utilizando-se de uma oratória fascinante. Com ela, pela 1ª vez, assisti a um filme na Escola – Lancelot, o primeiro cavaleiro, cuja finalidade era introduzir o assunto sobre Estilos de época.
Nessa escola, onde cursei o EM tinha biblioteca, mas não tinha funcionário disponível para mantê-la aberta. A única maneira de conseguirmos acesso dava-se quando convencíamos um dos professores da Escola a fazer aquilo que chamávamos de “aula diferente”.
Não considerava inútil o ensino do verb to be, mas sabia que, se os alunos não conseguiam compreender a irregularidade dos verbos ser e estar na língua mãe, imaginava impossível faze-lo em uma língua na qual a maioria dos alunos era quase unânime em indagar sobre as razões de se ensinar tal conteúdo na escola e qual a utilidade do mesmo no dia a dia. O pior era ouvir a mesma resposta, já citada por todas as professoras que davam aula de inglês desde a 5ª série – o mundo está globalizado, o inglês é uma língua universal e, daqui a algum tempo será exigido para ingressar no mercado de trabalho. Parecia piada, pois tinha colegas que estudavam por imposição dos pais e não estavam nem aí para a idéia de trabalhar. E, hoje, critico no ensino do English (disciplina que sempre tentam me convencer para dar aula para complementação de carga horária), propostas como traduzir uma música de James Blunt (como Same mistake, Carry you home) só pelo fato da música estar em evidência devido a audiência de uma novela global, a qual, a utiliza como parte integrante da trilha sonora. Não há a preocupação com a aquisição do vocabulário. Nem somente em relação ao English, mas ao ensino de Equação ou Função do 2º Grau, no qual, os dados resultantes dos cálculos servem apenas para indicarem o percurso da parábola na construção do gráfico (um absurdo).
Tive um professor de Biologia e Química que, devido a falta de professores, sempre adiantava as aulas e, sempre solicitava-me para escrever o assunto no quadro, não apenas pelo fato da minha pessoa fazer uso de uma caligrafia de fácil entendimento / compreensão, mas, também devido a falta de livros. Ele sempre passava o assunto sob a forma de esquemas e, depois que eu os copiava no quadro, levava-os para casa para anota-los em meu caderno, e assim, aproveitava para promover o desdobramento dos meus estudos. Essa era uma das oportunidades de leitura que promovi durante do Ensino Médio.
Continuei a mesma tendência de gostar de assuntos direcionados à História. A literatura foi um desses suportes assuntos, pois a sua composição e compreensão estavam relacionadas a um contexto. Li neste período:
Þ “Ilíada” e “Odisséia”, de Homero;
Þ “A Dama das Camélias”, de Alexandre Dumas;
Þ “Confissões”, de Santo;
Þ “Otelo, o mouro de Veneza”, de William Shakespeare;
Þ “Noite na Taverna”, de Álvares de Azevedo, entre outros.
De todas essas, as mais marcantes foram “Ilíada”, de Homero e “Otelo, o mouro de Veneza”. A primeira, pela consciência em relação a assuntos como fama, objetivos e a morte e a segunda pelo aspecto trágico advindo da inveja.

NA UNIVERSIDADE / FACULDADE...
Quando ingressei na Universidade em 2001, considerava-me um “bom escritor”. Tomei um susto quando ao final do primeiro semestre tive de deparar-me com a chamada “Prova Final”, na disciplina Oficina de Redação, cuja circunstância já mencionei em outro ponto deste memorial. Além disso, vi que, alguns professores subestimam seus alunos.
Um exemplo disso, deu-se quando a professora de Metodologia do Trabalho Científico I passou um trabalho, solicitando dos alunos a escrita de uma resenha e afirmou na sala que nenhum dos alunos tinha capacidade de faze-lo. Aquilo foi estarrecedor. Na época estávamos vivendo sob a política de racionamento de energia e a minha mãe levava a risca a proposição do Governo. Para estudar, o fazia à luz de velas ou de candeeiros. A fumaça tomava conta das narinas e as camisas brancas não podiam ser utilizadas visto que passavam por uma metamorfose em questão de minutos. Como não tinha o hábito de fazer leituras extensas sob pressão, avistei-me diante do desafio de ler 03 livros durante 04 dias e cada um dos livros continha em média 290 páginas para conseguir escrever em relação à proposta da professora. Ao terminar o trabalho, ela não me dera a nota máxima, por que pedi para que ela refletisse ao supor uma pressuposta incapacidade dos alunos. Dias depois, ao findar o contrato dela, a mesma foi-se embora. Confesso acreditar não haver espaço para a saudade.
Em relação ao conhecimento, reclamo dos momentos de (des) construção de conceitos ora trabalhados como importantes no aprendizado da língua desde a 7ª série, como o conceito de “Denotação” e “Conotação”, do qual, somente após a saída da Universidade, abdiquei do uso, pois, não existe palavra cujo valor semântico esteja restritamente ligado exclusivamente a uma das definições supracitadas, mas que continuam difundidas nos livros didáticos, ensinadas e causando uma enorme confusão na cabeça do aluno.
Outro fato, era deparar-se com um professor que ao anunciar uma proposta de trabalho para os alunos e ouvir destes a reclamação quanto ao prazo, respondia “Vida na Universidade é luta e sofrimento”.
Pior do que isso é a utilização da técnica do Seminário. Ao ouvirmos tal sugestão, tínhamos a certeza de que o professor queria “enrolar”, ou não dominava a matéria. Além disso, tinha a polêmica divisão em grupos de observação e grupos de verbalização tão criticados, mas sempre utilizadas sob o pretexto de aguçarem a capacidade de construção de argumentos em grupos.
Mas, nem tudo é sofrimento. Havia, sim, as leituras prazerosas, os momentos agradáveis. Numa das fases de dessemestralização, deparei-me com uma turma cujos alunos conseguiam transformar as apresentações de trabalhos em verdadeiros festivais. Conseguiam transformar os conceitos em roteiros de apresentações teatrais e, graças a tais fatos, despertei-me para a familiarização com o trabalho com músicas. A música promove a sensibilidade e facilita o trabalho com a diversidade cultural e com o conhecimento prévio do aluno.
No tocante à leitura, as mais marcantes foram Filhos Brilhantes, Alunos Fascinantes, de Augusto Cury e Uma pequena luz na escuridão, de Gilberto Bahia. Não estavam entre as recomendadas na bibliografia utilizada na Universidade, mas despertaram duas sensibilidades importantes. A primeira consiste em conhecer ao outro, enquanto a segunda representa a descoberta de que a leitura deve ser acompanhada de representação e vivência do que está sendo lido. Isso me provocou um conflito, pois, sai da questão da obrigatoriedade, para mergulhar na atmosfera do prazer em ler.

MEU UNIVERSO DE LEITURAS – PENSAR E VIVER O PRAZER EM LER.
Posso considerar-me um ávido leitor. Li a Bíblia duas vezes em 08 anos, pois a considero um livro de compreensão metafísica, entretanto, sem negar os saberes ali difundidos. No entanto, nesse mesmo período li, aproximadamente, 540 obras relacionadas a filosofia clássica (de Aristóteles a Foucault), vários dos clássicos universais como Hamet, Don Quixote de La Mancha, Decamerão, A Divina Comédia, Romeu e Julieta. Sou apaixonado por obras relacionadas a mitologia ocidental e atualmente, desenvolvo uma pesquisa independente sobre a construção textual da série Cavaleiros do Zodíaco. Gosto de filmes, como Sociedade dos Poetas Mortos, Lancelot – O primeiro Cavaleiro, Um amor para recordar, entre outros.